EU AJUDEI A DESTRUIR O RIO
Sylvio Guedes,
editor-chefe do Jornal de Brasília, critica o "cinismo" dos
jornalistas, artistas e intelectuais ao defenderem o fim do poder paralelo dos
chefes do tráfico de drogas. Guedes desafia a todos que "tanto se drogaram
nas últimas décadas que venham a público assumir:
EU AJUDEI A DESTRUIR O RIO
EU AJUDEI A DESTRUIR O RIO
É irônico que a classe artística e a categoria dos jornalistas estejam agora na, por assim dizer, vanguarda da atual campanha contra a violência enfrentada pelo Rio de Janeiro. Essa postura é produto do absoluto cinismo de muitas das pessoas e instituições que vemos participando de atos, fazendo declarações e defendendo o fim do poder paralelo dos chefões do tráfico de drogas.
Quando a cocaína
começou a se infiltrar de fato no Rio de Janeiro, lá pelo fim da década de 70,
entrou pela porta da frente. Pela classe média, pelas festinhas de embalo da
Zona Sul, pelas danceterias, pelos barzinhos de Ipanema e Leblon.
Invadiu e se instalou
nas redações de jornais e nas emissoras de TV, sob o silêncio
comprometedor de suas chefias e diretorias. Quanto mais glamoroso o
ambiente, quanto mais supostamente intelectualizado o grupo, mais você podia
encontrar gente cheirando carreiras e carreiras do pó branco.
Em uma espúria relação
de cumplicidade, imprensa e classe artística (que tanto se orgulham de serem,
ambas, formadoras de opinião) de fato contribuíram enormemente para que o
consumo das drogas, em especial da cocaína, se disseminasse no seio da
sociedade carioca - e brasileira, por extensão.
Achavam o máximo; era,
como se costumava dizer, um barato. Festa sem cocaína era festa careta.
As pessoas curtiam a
comodidade proporcionada pelos fornecedores: entregavam a droga em casa, sem a
necessidade de inconvenientes viagens ao decaído mundo dos morros, vizinhos aos
edifícios ricos do asfalto.
Nem é preciso detalhar
como essa simples relação econômica de mercado terminou. Onde há demanda, deve
haver a necessária oferta. E assim, com tanta gente endinheirada disposta a
cheirar ou injetar sua dose diária de cocaína, os pés-de-chinelo das favelas
viraram barões das drogas.
Há farta literatura
mostrando como as conexões dos meliantes rastacuera, que só fumavam um baseado
aqui e acolá, se tornaram senhores de um império, tomaram de assalto a mais
linda cidade do país e agora cortam cabeças de quem ousa lhes cruzar o caminho e
as exibem em bandejas, certos da impunidade.
Qualquer mentecapto
sabe que não pode persistir um sistema jurídico em que é proibida e reprimida a
produção e venda da droga, porém seu consumo é, digamos assim, tolerado.
São doentes os que
consomem. Não sabem o que fazem. Não têm controle sobre seus atos. Destroem
famílias, arrasam lares, destroçam futuros.
Que a mídia, os
artistas e os intelectuais que tanto se drogaram nas três últimas décadas
venham a público assumir:
"Eu ajudei a
destruir o Rio de Janeiro."
Façam um adesivo e
preguem no vidro de
seus Audis, BMWs e
Mercedes.
Fonte.
Jornal de Brasília.
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